Por que algumas pessoas optam por uma dieta mais sustentável?
- Raissa Gvozdar Schreiter
- 25 de jan. de 2017
- 6 min de leitura
Vivemos um período de transformações no mundo. Os seres humanos estão desenvolvendo a cada dia novas tecnologias que influenciam diretamente no cotidiano. A matéria-prima para a fabricação desses artigos tecnológicos é a mesma da antiguidade: a natureza. Outro fator herdado de nossos antepassados é a dieta a base de alimentos de origem animal. O que nos difere é o acesso facilitado a todo e qualquer tipo de alimento, já que não dependemos mais de técnicas primitivas como a caça para abastecer nossos estoques.
O consumo acelerado e crescente induz muitos dos produtores de larga escala a adotarem medidas nocivas ao meio ambiente e à vida. Entre elas estão o uso de agrotóxicos nas grandes plantações, a criação de animais para o abate ou mesmo o cultivo de transgênicos. De acordo com o Ministério da Agricultura, são considerados transgênicos organismos modificados por meio de técnicas de engenharia genética que tem a capacidade de transferir genes específicos de um organismo para outro, inclusive de espécies diferentes. O principal objetivo tanto do cultivo de alimentos transgênicos quanto do uso dos agrotóxicos é evitar que pragas prejudiquem as plantações.
Não é difícil estar a par dos assuntos referentes à agricultura e pecuária, conhecer a maneira comercial de lidar com o ambiente e os seres vivos. Por isso, muitas pessoas estão aderindo dietas alternativas como forma de protesto e/ou em prol da saúde e preservação do planeta. São elas o vegetarianismo, o veganismo e a alimentação a base de produtos orgânicos.

PRODUTOS A VENDA NA FEIRA ORGÂNICA.
O vegetarianismo
Ser vegetariano (a) implica em abolir a ingestão de qualquer tipo de carne ou produtos processados de origem animal. O que não significa, necessariamente, que vegetarianos baseiam sua dieta em frutas, verduras e legumes. Existem vegetarianos que consomem em receitas ou diretamente derivados como laticínios, ovos e mel - ovolactovegetarianos e lactovegetarianos. Outros, seguem o vegetarianismo restrito e não consomem nem mesmo derivados.
Monica Lília Grippo (55) é consultora técnica legislativa e vegetariana há quatro anos. Para ela, o vegetarianismo está vinculado a questões político-ideológicas e espirituais. Depois de morar com a sobrinha e conhecer os "novos sabores" das receitas vegetarianas, ela passou a ingerir cada vez menos carne bovina até que deixou de comer todo e qualquer tipo de carne. Atualmente ela ainda consome alguns derivados como ovos e queijo, mas não bebe leite.
Para Monica, o marco da conversão completa ao vegetarianismo foi uma ocasião em que a convidaram para almoçar em uma renomada churrascaria de São Paulo, onde havia carnes de muitos animais. De acordo com a consultora, tudo o que ela conseguia enxergar era um grande desperdício de comida. "Davam para as pessoas experimentarem todo tipo de carne que existia lá. Elas pegavam um pedacinho de nada e jogavam fora. Era mais carne jogada fora do que realmente ingerida ou utilizada. Aquilo me chocou muito, era uma vida que estava ali. Quantas vidas as pessoas não estão jogando fora?".
Monica defende, portanto, que se trata de "um extermínio do animal como se fosse mais um produto de consumo para o bem-estar e, também, mal-estar do ser humano, já que o excesso de consumo da carne causa uma série de doenças e problemas de saúde.".
A consultora afirma que a dieta vegetariana fez bem ao seu paladar, modificou-o completamente. Ela é uruguaia e contou que em seu país a atração principal dos pratos é sempre alguma opção de carne. Essa tradição, segundo ela, é o fator responsável pela criação da dependência pelo sabor desse alimento o que, consequentemente, diminuiu a sensação do gosto dos outros elementos que o acompanham.
Monica expressou alegria ao falar sobre novidades gustativas. "São muitas texturas, muitos sabores, é uma maravilha! Comecei a cozinhar com mais gosto.".
Por fim, ela explicou o que vê de positivo para o meio ambiente no vegetarianismo. "Na questão ecológica você tem a devastação de florestas para a criação de gado, o plantio de soja transgênica cuja maioria da produção é destinada a fabricação de ração animal.".
O veganismo
É considerado vegano quem não ingere carne, qualquer alimento de origem animal diretamente ou contido na receita do produto e procura abolir quaisquer artigos testados em animais ou que sejam fabricados por algum processo de exploração dos mesmos. Há quem defenda que é praticamente impossível ser totalmente vegano, principalmente para indivíduos que vivem em centros urbanos.
Edson Sá (53), artesão, criou a página no Facebook "Veganismo alcalino e sustentável". Ele é vegano desde 2000 e já foi adepto do frugivorismo. Antes disso, era macrociótico e, atualmente, se considera freegano e crudívoro. Frugivorismo é a dieta a base de frutas, mas que também pode incluir verduras e legumes crus.
Freeganismo é a prática de alimentação sem gastos, ou seja, do que é "jogado fora" pelos produtores e comerciantes. O freeganismo não é praticado apenas por veganos, já que pode estar também relacionado ao consumo de carnes e outros derivados de origem animal.
Crudivorismo é o cultivo do hábito alimentar que exclui cozimentos, frituras ou assados.
Existem veganos que aderem à prática do jejum, ou seja, passam um considerável intervalo de horas sem comer, variando de pessoa para pessoa, de acordo com a adaptação do organismo.
Edson contou em entrevista que durante anos sofreu problemas de saúde como pedras nos rins, diabetes e asma. Na época ele não era vegano e consumia, além de produtos de origem animal, muitos doces. Certa vez trabalhou com um grupo de pessoas que adotavam o estilo macrobiótico. Adotou-o também, temporariamente, e notou uma melhora na saúde. Posteriormente, em outra experiência de trabalho, na Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, relatou em seu blog ter testemunhado o que ele chama de "sacrifício" dos animais em "nome da ciência".
Depois de passar por essas experiências e assistir a alguns vídeos no portal PETA (People for the Ethical for the Treatment of Animals) sobre o processo de fabricação de alimentos a partir do abatimento de animais, Edson começou a pesquisar a respeito do veganismo. Aos poucos, foi mudando seus hábitos alimentares e estilo de vida.
Sobre a transição para se tornar vegano, na experiência do artesão, somente a exclusão dos tipos de carne e derivados na alimentação não foram suficientes para a melhora de sua saúde. "A primeira coisa que eu notei foi a diminuição das doenças, principalmente do peso. Mas isso demorou um pouco porque a minha alimentação continuava pesada, comia arroz, feijão, proteína de soja, frituras....Só comecei a sentir que valia a pena depois de me tornar crudívoro.", concluiu.
Tornar-se crudívoro foi uma atitude revolucionária para a saúde de Edson. "Só quando mudei para o crudivorismo me senti muito mais disposto e sem nenhuma vontade de comer carne. Durante os primeiros jejuns com água, me sentia fraco, mas conforme ia me desintoxicando, essa fraqueza diminuía.".
O artesão também contou um pouco de sua experiência e adaptação ao freeganismo. "No caso do freeganismo criei o 'freeganismo alcalino' que só pega alimentos saudáveis descartados. A minha horta ainda está no começo, mas meu objetivo é ser cem por cento sustentável e não precisar mais comprar comida. Eu gasto em torno de R$30 por semana para [compra de alimentos que suprem a necessidade de] duas pessoas na feira, incluindo frutas, legumes e verduras. Às vezes, esse custo cai pra R$15, quando tenho colheitas e encontro algum alimentos que vai ser descartado no mercado.".
*Macrobiótica é uma tradição milenar de estilo de vida baseada no equilíbrio com a natureza. Sendo assim, os indivíduos que a adotam se alimentam de acordo com o que a natureza produz na região onde moram. Em decorrência disso, priorizam o consumo de grãos, leguminosas e hortaliças, entretanto, podem incluir a carne de peixe na dieta.
Alimentação orgânica
Nem todo alimento cultivado sem o uso de agrotóxicos pode ser considerado orgânico. Segundo o Ministério da Agricultura, a agricultura orgânica é planejada para um espaço que considere a sustentabilidade social, ambiental, econômica e valorize a cultura das comunidades rurais. Não somente os agrotóxicos são proibidos nesta prática, como também hormônios, drogas veterinárias, adubos químicos, antibióticos ou transgênicos em qualquer fase da produção.
Beatriz Cecília Garcia (52) é dentista e falou a respeito da sua relação com os orgânicos que já dura três anos. Ela diz ter começado a consumir esse tipo de produto por recomendação de seu nutrólogo. Atualmente, Beatriz vai a feira de orgânicos aos domingos e compra alimentos para a casa dela e da mãe. "Hoje em dia a gente vê tanta gente doente que começamos a fazer uma reflexão sobre isso. Sabemos que os agrotóxicos contribuem para contração de doenças. Também penso muito na questão do meio ambiente, porque a o agrotóxico que é pulverizado contamina o solo, os rios e a própria pessoa que está plantando. Ao usar o agrotóxico, ela mesma está sendo contaminada.".
Além dos benefícios para a saúde, a dentista também acrescentou sobre os pontos positivos para o paladar. "Eu acho que o alimento orgânico é muito mais saboroso. Hoje em dia eu consigo, inclusive, sentir o sabor do agrotóxico depois de tanto consumir só orgânicos. Quando vou em algum lugar que tenha algum alimento não orgânico, principalmente folhas, enfim, alimentos crus, o não-orgânico tem um sabor amargo. Ele [o alimento orgânico] é muito mais suave, doce."
Beatriz evita carne bovina, mas não segue nenhum tipo de dieta vegetariana, se alimenta com frango, peixe ou carne de porco. Ela disse ter sido vegetariana durante três anos, mas deixou de lado a dieta depois de ter recebido a orientação médica de que sua filha pequena deveria comer carne.
Tanto Edson quanto Monica também se disseram a favor da alimentação com produtos orgânicos, entretanto, não adotam uma dieta exclusiva por constatarem que pesa no bolso. Beatriz, porém, avalia que o custo-benefício vale a pena para ela. "Mesmo quando eu percebi estar gastando um pouco mais, o raciocínio foi: melhor gastar um pouco mais em comida do que em medicamento. Eu tenho 52 anos e não tomo remédio para nada.".
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